ENTREVISTA:
Conexão Literatura: Poderia contar para os nossos leitores como foi o seu início no meio literário?
Fabrício Cardoso: Sempre tive um gosto pela leitura, sabe aquele menino tímido que encontrava na literatura seu refúgio para encarar o mundo. Assim, escrever começou como uma maneira de interpretar o mundo que havia em mim, meus dilemas de adolescência, acho sempre importante contar esse início, pois, foram estes primeiros escritos que me motivaram a caminhar pela estrada literária. Porém, minha vida atribulada também se refletiu no campo literário, primeiro era necessário me ver como alguém que poderia escrever algo que fizesse sentido para mim e para as pessoas ao meu redor. Sou professor e fui estudante de jornalismo, dessa maneira, escrever como profissão já estava no percurso. Mas, a virada de chave foi ter encontrado fortes laços de amizade que viram para além da escrita uma humanidade no que eu me propunha. Escrevia, traduzindo os sentimentos daqueles que estavam ao meu redor, a esse mundo multifacetado e desafiador ao qual vivemos. Tive uma trajetória como à de vários outros autores no Brasil. Enviei meu material na busca de ser lido, de uma chance para me conhecerem, vários não, e, isso faz parte dessa carreira, tendo sido em 2011 o início dessa caminhada. Mas, por volta de 2017, após tanto insistir, tendo começado e recomeçado tantos projetos, tive a oportunidade de participar de um concurso literário que envolvia uma editora em Portugal, nunca fui ao país (quem sabe no futuro), porém, foi lá que recebi uma avaliação, e, melhor ainda, era uma avaliação positiva. Minha escrita fazia sentido, foi o que pensei. Entretanto, o sonho de produzir um livro precisou ser adiado um pouco, nesse tempo, minha mãe precisou de cuidados de saúde, foi um momento bem difícil em particular e infelizmente veio a falecer em 2018. E como todos sabem logo depois veio a Covid-19 em 2020, fazendo as distâncias da produção do livro aumentar. No entanto, em 2021, pelo Grupo Editorial Atlântico, em Lisboa, meu projeto intitulado Duas Cidades enfim foi lançado, contando um pouco daqueles dez anos que havia vivido na poesia e abrindo as portas para um novo mundo do qual sempre havia sonhado em entrar. Acredito, que cada livro escrito, cada poema no meu caso, carrega sonhos, aspirações meus, vividos como, por exemplo, na minha cidade natal em São Leopoldo no Rio Grande do Sul e que com o lançamento puderam ser compartilhados com outros sentimentos de pessoas que nunca os vi no Brasil, em Angola, Cabo Verde e tantas outras cidades deste mundo.
Conexão Literatura: Você é autor do livro “Duas Cidades”. Poderia comentar?
Fabrício Cardoso: Sim, o livro Duas Cidades nasceu desse intuito de valorizar a minha caminhada como escritor e, justamente o seu título é uma metáfora de minha vida. A cidade que habita em mim e aos quais debruço o meu olhar dialoga com o mundo físico e das sensações. Assim, a cidade e as cidades aparecem na minha escrita, como cenário, nas diversas vidas e experiências, que podiam ser minhas ou daquelas que captavam a minha atenção. Como diria Walter Benjamin (historiador do início do século XX), ele era um “flaneur”, um sujeito que ao passear pelas ruas, ele as sentia, assim, como Carlos Drummond de Andrade também o fazia no Brasil. Já podes perceber as influências literárias que caminham em minha mente. Assim, cada dia, mesmo que um ato simples procura interpretá-lo, e, dessa maneira, acabo produzindo uma poesia humana. Duas Cidades se eu posso contar foi divido em três partes, três atos de uma peça teatral, na primeira vocês encontrarão o Fabrício professor, com os contatos das vidas que tive com os meus alunos (fui professor na periferia de São Leopoldo), traduzindo as agruras, lutas e vitórias dessas vidas em poesia. Também, terá os meus dilemas com o luto, a memória, a perda, e a fugaz sensação da vida. Na segunda parte vem o tema por excelência do poeta, o amor, os desamores, a frustrações, os nãos que recebi e transformei em histórias a serem contadas. E, por fim, lá estarão às memórias vivas, as homenagens, transformei as perdas em um ato de recordar, por isso a última etapa é a da valorização da vida daqueles que mesmo por um segundo transformaram e aqueceram o meu coração de escritor.
Conexão Literatura: Como é o seu processo de criação? Quais são as suas inspirações?
Fabrício Cardoso: Cada poema é um encontro único, mas, gosto de dizer que a poesia vem dos vários diálogos com a realidade, seja a que vivo diretamente, ou, a que existo. Lembro que Mario Quintana costumava anotar uma ideia e depois ia trabalhando sobre ela, neste sentido, também sigo este mesmo exemplo. Meu bloco de notas do celular é recheado de ideias, poemas que estão nascendo. Porém, também, como um historiador acabo tendo muito contato com tantas vidas, assim, essas experiências do ouvir o outro acabam servindo de inspiração para contar as histórias. Fernando Pessoa, dizia que o poeta era um mentiroso, mentia o sentir tão bem que passava a ser verdade, acredito que não seja mentira, mas, o ato de captar as sensações e exercitar a empatia literária, dessa forma, as histórias são espelhos da vida. Também, mais para o lado pessoal minha produção vem dos momentos, gosto de um lugar calmo para refletir, isso me mantém conectado com as minhas ideias, apesar, da correria do dia- a -dia. Sobre as inspirações, algumas já as citei acima, Fernando Pessoa e Mário Quintana, ou Carlos Drummond de Andrade, Pablo Neruda todos são leituras que amo ler e reler, mas, Zygmunt Bauman, Sartre e Dostoiévski também são leituras recorrentes que me inspiram na hora de produzir. Engraçado que quem for o que escrevo perceberá as referências sutis que deixo em cada poema destes autores e de tantos outros.
Conexão Literatura: Poderia destacar um trecho do seu livro especialmente para os nossos leitores?
Fabrício Cardoso: É sempre difícil escolher somente um poema, mas, vou procurar escolher algumas partes que ajudam a descrever meu trabalho:
“Vejo nos olhos dessa gente!
Mais do que vocês podem entender!
Pois, não foi a fome, o frio, a dor,
A solidão que os derrubou
Pois, uma alma que sonha.
É uma alma eterna.
E mesmo que toda a escuridão do universo
Surjam sem a gente perceber
Lembre-se que somos feitos
Com a mesma força que fazem as estrelas viverem
E então…
Brilhe!”
(Trecho do Poema “Somos Estrelas”, livro: Duas Cidades)
Conexão Literatura: Como o leitor interessado deve proceder para adquirir o livro e saber um pouco mais sobre você e o seu trabalho literário?
Fabrício Cardoso: Para aqueles que querem adquirir o livro Duas Cidades poderão comprar o livro pela Amazon (https://www.amazon.com.br/Duas-Cidades-Fabr%C3%ADcio-Cardoso-ebook/dp/B09VLHXWBG) , site do Grupo Editorial Atlântico, portal da Martins Fontes Paulista (https://www.martinsfontespaulista.com.br/duas-cidades-972016/p) e também, podem optar pela versão e e-book. Já para acompanhar meu trabalho de escrita e dialogar comigo conseguirão pela minha página no Instagram: @poeta_fabri_cardoso
Conexão Literatura: Como analisa a questão da leitura em nosso país?
Fabrício Cardoso: Essencial pergunta, afinal, quando escrevemos algo é também para ser lido por alguém. E, essa análise pode gerar tantas outras, como os nossos leitores estão lendo? O que estão lendo? O que querem ler? Como nosso mercado editorial está pensando essa escrita? E, se existe espaço para o escritor independente. Quando se inicia um caminho literário sempre nos paira no ar a questão, seremos lidos? Será um Best-seller ou algo do gênero. Bom, isso é uma das preocupações que eu tive e que já ouvi de tantos outros escritores nessa jornada literária. A literatura é ampla, e, não sou daqueles que acha que o nosso país lê mal, por vezes, sinto que ele é direcionado para esse caminho, mas, perceba, é uma análise crítica que aumenta os horizontes da sociedade. Eu poderia ser simplista e dizer que sinto uma receptividade do público africano, e, até mesmo do português são diferentes ao do brasileiro. Talvez, isso faça sentido por meu estilo poético ser mais contemporâneo e não buscando algo rebuscado. Porém, creio que deva e que, exista espaço para toda literatura. Nossos leitores não mudaram, apenas, o que houve foi uma mudança de como os encontrá-los. As plataformas digitais, as redes sociais, os eventos online nos permitiram alterar nossas fronteiras do mundo conhecido. Outras formas de fazer e sentir a literatura também trouxe novas maneiras de ser leitor. Vejo com bons olhos essas releituras dos clássicos feitas por influencers no TikTok, esse resgate repaginado de um Machado de Assis, ao mesmo, tempo, adoro entrar em sebos e perceber o êxtase de muitos leitores ao tocar nos livros físicos empoeirados do lugar. Claro que poderíamos ler mais, isso, manteríamos mais críticos da realidade, ainda temos pessoas analfabetas no país, assim, as discrepâncias de um continente nação são vistas e percebidas por nós que escrevemos. Óbvio que nem tudo são flores, mas, creio que o que estamos fazendo aqui é sim, uma das maneiras de fortalecer a leitura e a literatura em nosso país. E, que haverá um novo sol e um novo horizonte amanhã.
Conexão Literatura: Existem novos projetos em pauta?
Fabrício Cardoso: Sim, está programado para sair no início de 2025 meu segundo livro de poesias intitulado Geografia Sentimental, esse projeto começa na Pandemia e trabalha muito com a temática das distâncias, e, da realidade em que vivemos como sujeitos do século XXI. Será um prazer contar futuramente como foi esse projeto ao seu público leitor.
Perguntas rápidas:
Um livro:) O que sempre está na cabeceira da cama, Crime e Castigo e Fiodor Dostoievski
Um ator ou atriz: Penso em George Clooney ou Herrison Ford, minhas influências nerds, ou, Keira Knightley de Orgulho e Preconceito.
Um filme: Sempre cito Orgulho e Preconceito, a versão de 2005 do romance da escritora inglesa Jane Austen.
Um hobby: Quando não estou lendo, ou contemplando a natureza, me dedico ao futebol e aos esportes em geral.
Um dia especial: Aquele em que posso conviver com as pessoas que eu amo.
Conexão Literatura: Deseja encerrar com mais algum comentário?
Fabrício Cardoso: Claro, agradeço ao espaço de poder contar um pouquinho sobre mim, pela gentileza das perguntas. E, convido a todos a me acompanharem nas minhas redes sociais, conhecerem o livro Duas Cidades e que também venham a conhecer o livro Geografia Sentimental. Muito obrigado a todos.
Paulista, escritor e ativista cultural, casado com a publicitária Elenir Alves e pai de dois meninos. Editor da Revista Conexão Literatura (https://www.revistaconexaoliteratura.com.br) e colunista da Revista Projeto AutoEstima (http://www.revistaprojetoautoestima.com.br). Chanceler na Academia Brasileira de Escritores (Abresc). Associado da CBL (Câmara Brasileira do Livro). Participou em mais de 100 livros, tendo contos publicados no Brasil, México, China, Portugal e França. Publicou ao lado de Pedro Bandeira no livro “Nouvelles du Brésil” (França), com xilogravuras de José Costa Leite. Organizador do livro “Possessão Alienígena” (Editora Devir) e “Time Out – Os Viajantes do Tempo” (Editora Estronho). Fã n° 1 de Edgar Allan Poe, adora pizza, séries televisivas e HQs. Autor dos romances “Jornal em São Camilo da Maré” e “O Clube de Leitura de Edgar Allan Poe”. Entre a organização de suas antologias, estão os títulos “O Legado de Edgar Allan Poe”, “Histórias Para Ler e Morrer de Medo”, “Contos e Poemas Assombrosos” e outras. Escreveu a introdução do livro “Bloody Mary – Lendas Inglesas” (Ed. Dark Books). Contato: ademirpascale@gmail.com