Nosso Sol como Estrela Gigante Vermelha: através de processos gravitacionais, o Sol atingirá um diâmetro tal, que englobará a órbita de Marte, e um pouco além.

Ao
meu redor, brumas, envoltas em escuridão, deixando um círculo de luz baça em
volta de meus pés. Sinto o ar. Mofo, fungos e poeira tomam contam de meu
olfato, para a seguir invadirem minhas vias respiratórias, meus pulmões, seus
alvéolos e impedirem de que eu respire com facilidade.

Ando.
Estendo meus braços para a frente, tentando alcançar uma parede, uma porta, uma
saída. Conto os passos. O vazio permanece. Sinto-me desamparado e fraco, ao
andar cerca de dez metros. O suspiro da futilidade enganosa me alcança e eu me
ajoelho. Olho para cima e sinto como é denso e pesado o pesadelo no qual sei
que nenhum ser humano encontrou uma saída, nem por uma vez sequer.

Arrasto-me.
Fugidia ilusão é a prova de que estou sonhando. Ou não? Minhas energias se
esvaem. Apetece-me deitar de bruços e dormir, até que as Eras Futuras cheguem
ao seu final, que o Universo se torne escuridão total. Mas sei que é
impossível, esse desejo. Encontro-me em lugar de penitência e morte. Morrerei
antes que a luz que me cerca se apague. Ficarei até o momento em que seres
abismais que construíram este lugar não precisem de minha dor para sentirem
prazer.

Arrasto
minha perna direita e estendo os braços. Consigo me colocar de pé. Adoraria
gritar, mas, sem um ruído de minhas cordas vocais, ouço um metralhar à
distância. É diferente de uma rajada de fuzil automático. É moroso, preguiçoso
e parece algo que esmaga. Está vindo em minha direção, de algum lugar à minha
direita.

Corro,
a princípio arrastando as pernas, sentindo tonturas que se transformam em
ânsias de vômito. Engulo a saliva grossa do refluxo gástrico. Sinto que vou
vomitar a qualquer momento. Escarro e cuspo várias vezes sucessivas. O enjoo
melhora.

Consigo
andar, trôpego e fraco, até que, sem aguentar o esforço, caio de joelhos. Um
zunido acoberta o som da metralha. Sei que serei esmagado, mas, sem me
importar, deito-me de lado. E, encoberto pelos fantasmas do sono, minha
realidade se torna breu e eu sou levado pelos anjos de Morfeu aos domínios do
Reino dos Sonhos.
 

–//– 

Um
ruído pesado e desagradável me acorda. Um veículo alto, maciço, de esteiras,
está a meu lado. Vejo um cano de descarga de fumaça no seu topo, despejando
fumaça e mau cheiro no ambiente antisséptico que me rodeia. Uma porta se abre
para cima, tal qual as asas de um pássaro.

Uma
mulher desce os degraus de saída e permanece de pé, me fitando. Tira do bolso
um objeto que poderia ser uma arma portátil, mas o cano é dividido em duas
partes, cada uma em formato de elipse. Há uma coronha e um gatilho. A mulher
aponta a arma par mim e dispara. Vejo minha pele cintilar como cristal
lapidado, nas sete cores do arco-íris. Olho para a atiradora e agradeço. Ela
balança a cabeça e espera.

Fico
de pé, recuperei minhas energias. Dou um passo em direção ao veículo. A mulher
acena e eu subo os degraus. Sento em uma poltrona, fixada a dois metros das
duas acomodações para os pilotos. A porta se fecha, um som de ar comprimindo se
elevando. Um painel sob o para brisas e outro no teto se iluminam, o verde
fluorescente de suas telas desconhecido para mim.

 Um brilho que cega. A única coisa que me passa
pela cabeça, quando vejo a luz que atravessa os para brisas. Atravessamos uma
estrutura em forma de domo, com a fumaça do veículo de esteiras se confundindo
com os gases que obliteravam minha visão, há minutos… ou horas, antes. A
piloto se vira para mim e fala. Sua voz monocórdia não tem sentido. Poderia ser
russo ou chinês, que não faria a menor diferença.

Comecei
a suar. Olhei para o alto, através de uma vidraça instalada na lateral do
veículo e entendo. O Sol tem dez vezes o diâmetro da estrela que eu conhecera,
na Terra. E se esta for a Terra, o domo fora construído para proteção dos
últimos habitantes de meu mundo.

Se
eu sair, morrerei. Decidi esperar.

O
carro de esteiras era barulhento, mesmo no interior. Viajamos por cinco horas e
chegamos a um acampamento. Naves decolavam na vertical e subiam os céus. Outra
cúpula, fechada, era circundada por uma cerca. Um portão nos deixa entrar no
acampamento militar. Um outro veículo, sobre rodas, começava a subir a rampa de
entrada em um veículo grande, pesado, que recolheu sua rampa, assim que o
veículo atingiu seu interior.

A
mulher era elegante e jovem. Uma lutadora, pelo seu físico esguio e, ao mesmo
tempo, encorpado. Apanhou um microfone e falou nele:


Você é o último a deixar a Terra. Logo, o Sol englobará tudo, até a órbita de
Marte. E além. Nossa nave vai chegar em um curto período de tempo. Tenha paciência.

Ela
se virou para o painel de instrumentos e entrou em contato com outra pessoa,
falando naquela língua que eu mal conseguia distinguir uma sílaba da outra.
Esperamos duas horas. Uma estrutura em forma de meia circunferência pousou,
englobando a cúpula que existia na base, as sombras de seu casco deixando tudo
na semiescuridão.


Agora, podemos descer, Shaw. Verá maravilhas de tecnologia que sua mente jamais
imaginou. Verá seres repulsivos, criaturas semelhantes às que existiram neste
planeta moribundo, mulheres belíssimas e outras nem tanto, verá construções
titânicas, naves ameaçadoras e aerodinâmicas, algo que lembra as últimas
versões dos caças Raptor, porém, tão poderosas quanto cem bombas de hidrogênio
— Ela falava no microfone, pequena esfera de metal que brilhava, refletindo o
verde dos painéis de controle.


E o que aconteceu com os dez bilhões de terrestres, que viviam comigo e, em uma
fração de segundo, desapareceram das ruas das cidades? Morreram…? — Enquanto
eu falava, uma voz baixa reproduzia minha fala na língua da piloto.


Saberá de tudo, no destino. Sua estrela está prestes a se tornar gigante
vermelha em cinquenta minutos. No momento, a temperatura no exterior é de
trezentos graus Kelvin. Não se preocupe — e ela se virou para a frente,
começando a falar em outra língua com outros, pelo microfone.

Eu
sabia que poderia ser um truque, mas para que se darem tanto trabalho para
elaborarem uma encenação tão complexa? Seria mais fácil se me teleportassem ou
me raptassem no meio da noite e me levassem ao seu mundo.

Pensei
que era possível que aquilo fosse real. Sentia o banco de passageiros, o teto,
as janelas. Sabia que poderia haver algo de sinistro em tudo aquilo, mas como
eu poderia vir a conhecer aquele jogo? Resolvi aceitar a versão da piloto.
Fazia sentido…


Podemos sair, Shaw. Sairemos em dez minutos.


Há quanto tempo — perguntei para minha captora — vem se dedicando a essa tarefa
tão benevolente, hã… seu nome, qual é?


Sou Moníka. Não somos benevolentes, como pensa. No passado, quando seu Sol
possuía cinco diâmetros do que era em sua época, teleportamos suas reservas
naturais de metais, terras-raras, gases da atmosfera, em quantidade pequena,
mas suficiente para a reproduzirmos em outro planeta, e terraformamos tal
planeta árido e sem vida. Em trezentos anos, obtivemos uma outra Terra,
adequada para que a raça humana vivesse. Em troca, exigimos sua cooperação, no
maior projeto humanoide já engendrado, a luta para reavermos o que foi nosso,
há milênios. Um outro povo, poderoso além do que pode imaginar, aniquilou e
destruiu a maior parte de nossa civilização, em planetas bilhões de anos-luz
além do Sistema Solar. É hora de darmos o troco. Com dez bilhões de seres
humanos, a maior quantidade de lutadores em potencial que já detectamos,
poderemos dizimar os Djim.


Quer dizer que nos recrutou… sem nossa permissão?


Demos a vocês uma outra chance, além de morrerem sob o calor mortal de seu Sol
gigantesco.

Shaw
sabia que isso poderia ser outro ardil. Mas as possibilidades eram duas,
somente. Verdade ou mentira.


Vamos, Shaw, chegou a hora.

Eles
desceram do veículo, quando a porta se abriu e ela indicou o caminho. Foram
para um cilindro de vidro liso e polido como um espelho, situado no centro da
área em que a nave descera, entraram nele e subiram, rápido.

A
nave em forma de semicircunferência deixou o planeta. Uma olhada por uma janela
inquebrável fez Shaw mudar de ideia. Foi como olhar para o próprio Inferno,
prestes a se abater sobre a pequenina Terra. Shaw ganhara seu próprio microfone
esférico e a mulher começou a falar:


O que acha da nave?


Acha que estou apto a combater em ambientes desconhecidos e hostis?


Receberá por telepatia o treinamento. Depois, tudo o que aprender será
automático, sem erros, sem dar chance aos Djims uma única chance. Lutaremos a
seu lado. Mataremos, destruiremos alvos militares, do espaço. Pilotaremos com
maestria astronaves para dois, três, dez, mil guerreiros. Será fácil, com as
fitas mentais que temos conosco. E tal conhecimento ficará impregnado em seus
intelectos por um bilhão de anos.

Shaw
teve um pressentimento. Nada era indestrutível. O Universo fora feito a partir
da destruição de uma singularidade cósmica. E continuaria a se autodestruir,
até não haver mais nada que se parecesse com o Ovo Cósmico original.

Ele
sentou-se e olhou por uma vigia. Contra a vontade, viu quando a Terra foi
vaporizada pela onda de calor que uma explosão solar da envergadura de cem
planetas terrestres atingiu de raspão a superfície do Oceano Pacífico.

Tudo ficará bem,
pensou Shaw. Tudo dará certo.

E,
segurando com força a esfera que constituía o microfone tradutor, ele dormiu
por cinco anos, até que chegaram ao seu destino, a base de treinamento dos
terrestres.


SOBRE  O AUTOR:

Roberto Fiori é um escritor de Literatura Fantástica. Natural de São Paulo, reside atualmente em Vargem Grande Paulista, no Estado de São Paulo. Graduou-se na FATEC – SP e trabalhou por anos como free-lancer em Informática. Estudou pintura a óleo. Hoje, dedica-se somente à literatura, tendo como hobby sua guitarra elétrica. Estudou literatura com o escritor, poeta, cineasta e pintor André Carneiro, na Oficina da Palavra, em São Paulo. Mas Roberto não é somente aficionado por Ficção Científica, Fantasia e Horror. Admira toda forma de arte, arte que, segundo o escritor, quando realizada com bom gosto e técnica apurada, torna-se uma manifestação do espírito elevada e extremamente valiosa.
Roberto Fiori sempre foi uma pessoa que teve aptidão para escrever. Desde o ginásio, passando pelo antigo 2º Grau, suas notas na matéria de redação eram altas, muito acima da média. O que o motivava a escrever eram suas leituras, principalmente Ficção Científica e Fantasia. Descobriu cedo, pelo mestre da Fantasia Ray Bradbury, que era a Literatura Fantástica que admirava acima de qualquer outro gênero literário.
Em 1989, sob a indicação de uma grande amiga sua, Loreta, que o escritor conheceu a Oficina da Palavra, na Barra Funda, em São Paulo. E fez uma boa amizade com o maior professor de literatura que já tive, André Carneiro. Sem dúvida alguma, se não fosse pelo André, Roberto nos diz que jamais saberia o que sabe hoje, sobre a arte da escrita. Nos cursos que ele ministrava, o autor aprendeu na prática a escrever, as bases de como tornar uma mera história de ficção em uma obra que atraísse a atenção das pessoas.
“Futuro! – Contos fantásticos de outros lugares e outros tempos” é uma obra parte Fantasia, parte Ficção Científica, parte Horror, e que poderá vir a se tornar realidade, quer em outra época, no futuro, quer em outra dimensão paralela à nossa. Vivemos em um Cosmos que não é o único, nessa teia multidimensional chamada Multiverso. Ele existe, segundo as mais avançadas teorias da cosmologia. São Universos Paralelos, interligados por caminhos ou “wormholes” – buracos de minhoca. Um “wormhole” conecta dois buracos negros, ou singularidades, em que a gravidade é tão elevada que nada pode escapar de sua atração gravitacional, nem mesmo a luz. Em tais “wormholes”, o tempo e o espaço perdem suas características, tornam-se algo que somente pode-se especular e deduzir matematicamente.
“Futuro! – Contos fantásticos de outros lugares e outros tempos” é uma coletânea de treze contos e noveletas. Invasões alienígenas por seres implacáveis, ameaças vindas dos confins da Via Láctea por entidades invencíveis, a luta do Homem contra uma raça peculiar e destrutiva ao extremo, terrível e que odeia o ser humano sem motivo algum. Esses são exemplos de contos em que o leitor poderá não enxergar qualquer possibilidade de sobrevivência para o Homem. Mas, ao lado de relatos de pesadelo, surgem contos que nos falam de emoções. Uma máquina pode apresentar emoções? Ela poderia sentir, se emocionar? Nosso povo já esteve à beira da catástrofe nuclear, em 1962. Isso é realidade. Mas e se nossa sobrevivência tivesse sido conseguida com uma pequena ajuda de uma raça semelhante à nossa em tudo, na aparência, na língua, nos costumes? E que desejaria viver na Terra, ao lado de seus irmãos humanos? Há histórias neste livro que trazem ao leitor uma guerra milenar, que poderá bem ser interrompida por um casal, cada indivíduo situado em cada lado da contenda. E há histórias de terror, como uma presença, não mais que uma forma, que mata, destrói e não deixa rastros. 
Enfim, é uma obra de ficção, mas que poderá vir a se revelar algo palpável para o Homem, como na narrativa profética da destruição de um planeta inteiro.
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4 respostas

  1. Podem dizer o que quisserem, Daniel, mas é fato consagrado que, antes da realidade, veio a imaginação, e que esta imaginação sim, é que acendeu a primeira fogueira nos tempos do Homem de Neandertal.

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